Obrigada, Mestre!


Eu caminhava apressada pelas ruas daquela cidade grande, nem sei direito por qual motivo, mas lá ia eu, nas ondas da multidão.
-Ei, moça!-abordou-me um andarilho-A senhora está vendo aquele homem ali, deitado? -Perguntou-me apontando para baixo de uma ponte.
Meio assustada, com a cabeça fiz um gesto afirmativo, sem pronunciar palavra….
Maltrapilho, sujo e a exalar o odor peculiar a um corpo carente de água e sabão, o indigente olhando em meus olhos, continuou sua explanação, dizendo:
-Ele me pediu pra deixá-lo deitar-se um pouco, na minha cama…é verdade! Vamos lá pra senhora ver…
Possuída por uma inquietude sem igual, lá fui eu. O acompanhei a passos largos até o outro lado da rua onde, debaixo da referida ponte, sobre pedaços de papelão e farrapos do que , um dia, havia sido um cobertor, repousava o corpo do outro desfavorecido pela sorte. Tranqüilo, dormia o sono reservado aos justos e de consciência limpa…
-A senhora está vendo? Esta cama é minha.-afirmou aquele a quem eu acompanhei e agora dedicava total atenção, esforçando-me para reter, filtrar a mística daquele momento. O desvalido então, me questionou com autoridade:
-A senhora sabe por que eu o deixei dormir nela?
Ávida por uma resposta, expressei-me inquieta:
-Não! Me diga, por favor!
E como alguém que é derrubado por uma onda muito forte, recebi sua resposta:
-É porque a gente nunca sabe do dia de amanhã…
Eu? Fiquei ali. Parada, sem conseguir tirar os olhos do meu “mestre andarilho”, enquanto cabisbaixo e em silêncio ele se afastava, misturando-se novamente à multidão apressada e indiferente à tamanha sabedoria.
Ambiente inóspito aquela “sala de aula”; professor incompatível ao cargo; recursos didáticos totalmente incomuns: mas eu nunca havia aprendido tanto, em tão pouco tempo e com tanta eficácia! Obrigada, Mestre!
(Andréia Jacomelli Lima)

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